A difamação traz consigo um amontoado de males: ela deprava qualquer um que a ouve, causa o difamador ser considerado um caluniador, produzindo assim ódio aos que estão ao seu redor.
Deus fixou um enorme peso á esse pecado: a obrigação de restaurar a reputação do próximo. Estas palavras a seguirem, de Santo Agostinho, são verdadeiras tanto para difamação, como para dinheiro:
"Non dimittitur peccatum, nisi restituatur ablatum".
"Sem restauração não há perdão".
(St. Augustine, Epistle 65, Ad Macedoniae.)
É um princípio comum entre os teólogos (St. Tomás de Aquino Suma Parte II, Seção II, Questão 62, Artigo 2.) que a restauração da reputação do próximo é obrigatória não somente para aqueles que revelam um crime imaginário, mas também para aqueles que revelam um verdadeiro (mas secreto) crime. Eles são supostos a retornarem pelo menos uma compensação equivalente; eles devem esta compensação pelo detrimento não só de suas próprias reputações, como também de suas vidas. Juntamente com a reputação do próximo, eles terão que reparar todos os danos produzidos, mesmo se o que eles tiverem revelado seja verídico. Nesse caso, como o que eles dizem é verdadeiro, a reparação não deverá ser feita dizendo que eles mentiram, e sim que eles estavam fofocando, detratando.
Ainda que fosse somente pela incoveniência de ser obrigado a reparar a reputação do próximo, a fofoca, a calúnia e a detratação, deveriam ser evitadas como uma praga. Quão dolorido ter que retratar o que você disse e passar pela vergonha de tal restauração! É fácil retornar um ítem de vestuário, uma quantidade de dinheiro ou propriedade pessoal injustamente adquiridas; existem mil maneiras de como fazê-las. Mas restaurar uma reputação, que fardo!
A gravidade desse pecado consiste precisamente na dificuldade de repará-lo. Quando uma opinião é revelada, ela se espalha rapidamente por vários lugares, passando por cidades e até impérios, e com isso, pessoas desconhecidas adquirem um triste (falso ou secreto) e desnecessário conhecimento. Mas se você tenta louvar alguém que previamente denegriu, você está perdendo seu tempo. Pois o que você disse criou uma forte raíz e muitas pessoas tomaram conhecimento do que foi dito previamente.
As pessoas acreditam primeiramente nos males;
Mas quando se trata da bondade,
É ver para crer. (La Fontaine)
Mas você diria, "Fofoca e difamação estão em todos os lugares e ninguém restaura;
coisa alguma." Ah, este é precisamente o mal que eu deploro! Você pensa que nossos piores hábitos podem justificar nossos vícios? Só porque "todo mundo faz", isso lhe daria o direito de também fazer? O vasto número de tolos não faz a tolice ser louvável. Além do mais, é falso dizer que reputações nunca são reparadas. Eu preferiria pensar que elas somente ocorrem raramente. Mas admitirei que quando ocorre alguma reparação, ela é tão vagarosa, tão tarda, tão imperfeita!
Quão raro é para alguém retornar o tanto que roubou. Cegos como somos, preferimos adiar tudo para o tribunal supremo e esperar a vingança do Senhor. Muitas pessoas são obrigadas a restaurar após a morte o que elas não repararam durante a vida terrena.
São Vicente Férrer foi um dos mais notáveis Irmãos na família espiritual de São Domingos. Ele conversava tão eloquentemente que inúmeras pessoas vinham vê-lo pregar; Papa Calixto III assegurou que sua memória ficaria para sempre. Um dia São Vicente estava pregando no dever de reparar a reputação do próximo. O respeito que é de direito desse grande homem obriga-me a citá-lo textualmente:
"A pessoa que maliciosamente rouba a reputação de seu próximo é obrigada a restaurá-la no mesmo nível daqueles que roubam. Se o que você disse é secreto, mesmo sendo verdadeiro, você é obrigado a restaurar suas reputações. Caso contrário você não irá para o céu.
'Mas como posso restaurar isso?' você pode se perguntar. Você deverá contar á todos que estavam presente quando caluniou ou detratou o próximo para que não acreditem em você, que você detratou ou caluniou o próximo por maldade. Se a pessoa que você difamou tem conhecimento do ocorrido, você tem o dever de pedir perdão, etc. Muitos são condenados por tais difamações porque as palavras passam e nós esquecemos que dissemo-las, eles não tem escrúpulos sobre elas e nunca pensam em confessá-las."
São Vicente Férrer adiciona ainda, "Se alguém negligencia a fazer enquanto vivo, após a morte ele será obrigado, independente de si mesmo, a satisfazer para aqueles que ainda sobrevivem." Ele confirma seu ensinamento com a seguinte história:
"Dois homens haviam ultrajado a reputação de certa pessoa. Um deles morreu e o outro continuava vivo, assim como a pessoa ultrajada. O homem morto continuava nas chamas do purgatório. Após sua libertação, mas antes de ser admitido no céu, ele foi recomendado a reparar completamente a reputação da pessoa que ele havia denegrido quando vivo. Eu sei que é verdade que essa alma tenha voltado para esse mundo porque eu sou a pessoa difamada, foi a mim que ele veio para pedir perdão."
Ó Deus, se a reputação é uma coisa tão frágil e delicada, por que não tememos adquirir obrigações que nós devemos cumprir mesmo após a morte? "É eterna, Senhor, vossa palavra, tão estável como o céu. Vossa verdade dura de geração em geração, tão estável como a terra que criastes. Tudo subsiste perpetuamente pelos vossos decretos, porque o universo vos é sujeito." (Salmos 131: 89-91)
Portanto, a boa reputação não é para ser desprezada, pois ela é especialmente necessária para cumprirmos nossos deveres públicos. E por isso, também, se faz necessário restaurar a reputação alheia se roubamos-a de má fé, mais necessário até que a restauração de dinheiro.
Pecados da língua, Fr. Bélet. Editions Magnificat - St. Jovite
Um comentário:
Muito bem o teu ensino...Parabens...Deus te abencoe.
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